Crónica de Opinião – Lopes Guerreiro – 27/06/2023

Marco Abundância 27/06/2023

A crónica de opinião de Lopes Guerreiro.

Quando o espectáculo substitui a política a sério

Durante cerca de quatro meses funcionou, com transmissões em directo em canais de televisão, a Comissão Parlamentar de Inquérito à Tutela Política da Gestão da TAP, que dentro de algumas semanas produzirá um relatório, que, quase de certeza, vai gerar mais polémica do que esclarecer o que era pretendido: se a Tutela Política da Gestão da TAP foi exercida respeitando os superiores interesses do interesse público, a legislação e demais regras da boa gestão do Estado .

E porque é que não acredito que o Relatório esclareça tais objectivos e se transforme em mais uma polémica, que vai alimentar o debate político e a programação de canais de televisão e encher páginas de jornais, por mais uns meses, designadamente durante o Verão? Porque aquela Comissão Parlamentar de Inquérito se transformou desde o início num espectáculo político e mediático em que, mais do que tentar esclarecer fosse o que fosse, houve a intenção por parte da generalidade dos deputados que a integraram de fazer passar as suas mensagens, as suas verdades, as suas posições políticas de partida. Mais do que esclarecer quiseram confirmar as suas críticas.

Foi assim que assistimos a longas e, nalguns casos, penosas sessões daquela Comissão em que deputados tentaram espremer os inquiridos até à exaustão sobre questões que, não deixando de ser importantes, pouco ou nada ajudaram a esclarecer se houve erros políticos ou decisões danosas para o interesse público por parte da Tutela Política da Gestão da TAP. O longo tempo gasto com os tristes episódios ocorridos no Ministério das Infraestruturas mostram bem o que que acabo de dizer. A insistência e o pormenor a que a chegaram alguns deputados para tentar apurar quem chamou a polícia, quem agrediu quem, se um computador portátil foi roubado ou não mostram bem como perderam o foco do que estava em causa e tudo utilizaram para tentar mostrar que naquele ministério era tudo uma resbaldaria, em que o ministro João Galamba não tinha mão. Às tantas, mais parecia que estavam numa esquadra de polícia do que numa Comissão Parlamentar de Inquérito…

A falta de preparação de alguns deputados e todo o esforço que fizeram para confirmar as condenações feitas previamente na praça pública aos membros do governo envolvidos ficaram bem evidenciadas nas últimas inquirições a Pedro Nuno Santos e a Fernando Medina, em que estes saíram das audições, praticamente, incólumes e, no caso de Pedro Nuno dos Santos, quase, em ombros…

Exige-se transparência da gestão política e pública, pelo que os seus principais agentes devem, ser permanente escrutinados pelas entidades responsáveis, como são a Assembleia da República e as suas Comissões de Inquérito, e pela opinião publicada e pública. Transformar esse escrutínio num espectáculo degradante, como se de um dos mais rascas “reality show” se tratasse não leva a nada de positivo e só contribui para a má imagem dos políticos  e a degradação da Democracia.

Os deputados não devem cair na tentação de pretender usar o tempo das suas inquirições para dar espectáculo, na vã tentativa de ganhar fama, de se tornarem conhecidos, porque, na maioria dos casos, isso acaba de acontecer, mas pelas piores razões, ou seja porque mostram não estar à altura das suas responsabilidades.

Desta forma, estão a contribuir para os isolar cada vez mais na bolha política em que parecem gostar de viver, mas que os afasta cada vez mais da realidade em que os portugueses vivem, que os queriam a tratar com responsabilidade e seriedade da coisa pública e não a fomentar e a alimentar a chicana política.

É evidente que a solução não passa por limitar ou condicionar o escrutínio permanente e activo que deve ser feito a quem tem responsabilidades na política, designadamente em funções públicas. Mas esse escrutínio, quanto efectuado por agentes políticos, não pode cair na fácil tentação da clubite partidária, em que “nós somos os bons e temos sempre razão” e “eles são os maus e nunca têm razão”, onde a condenação na praça pública antecede as conclusões de uma qualquer Comissão Parlamentar de Inquérito ou o julgamento nos Tribunais.

Não é desta forma que se dignifica a Política e que os políticos se dão ao respeito. E os portugueses estão cada vez mais exigentes e exigem mais de quem os prepresentea e governa.

Até para a semana!                                                                             LG, 27/06/2023

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