Crónica de Opinião – Lopes Guerreiro – 26/11/2024

Marco Abundância 26/11/2024

A crónica de opinião de Lopes Guerreiro.

O 25 de Novembro divide o que o 25 de Abril uniu

Por decisão da direita, a Assembleia da República assinalou “com uma sessão solene o cinquentenário do 25 de Novembro de 1975”, que só se assinala no próximo ano, integrando-a “nas comemorações dos 50 anos da revolução de 25 de Abril de 1974.”

Importa, para se poder fazer uma avaliação da correcção daquela decisão, recordar, ainda que muito sucintamente, o que aconteceu naquelas duas datas.

Em 25 de Abril de 1975, um movimento de capitães sublevou-se, derrubou a ditadura, que dominou Portugal durante 48 anos, e entregou o poder a uma Junta Militar, sob compromisso de o devolver aos civis através da realização de eleições livres e democráticas, a realizar num curto espaço de tempo.

O movimento dos capitães, inicialmente constituído por razões corporativas – desagrado pela equiparação de oficiais milicianos aos do quadro permanente e cansaço pelas várias comissões na guerra colonial -, transformou-se rapidamente se em Movimento das Forças Armadas (MFA), que, juntando outras motivações de natureza política, foi o responsável pelo golpe militar no dia 25 de Abril.

Este golpe militar transformou-se logo nesse dia numa revolução, pela forte adesão do povo, que saiu às ruas apoiando o derrube da ditadura, revoltado contra o grande atraso no desenvolvimento e consequente estado de pobreza e de miséria em que vivia grande parte da população e do isolamento internacional de Portugal, em resultado do arrastamento da ditadura, que não reconhecia os mais básicos direitos das pessoas e proibia as liberdades, e se recusava a reconhecer o direito das colónias à independência, mantendo uma guerra injusta que, para além de sugar uma boa parte dos recursos do país, tinha a derrota anunciada, como já acontecera na Guiné.

O 25 de Abril foi, segundo Sophia de Mello Breyner, “O dia inicial inteiro e limpo / Onde emergimos da noite e do silêncio / E livres habitamos a substância do tempo”.

Readquirida a Liberdade que permitiu as várias liberdades, o Povo sonhou e acreditou que era, finalmente, possível tomar nas suas mãos o seu futuro e construir um Portugal desenvolvido, respeitado internacionalmente, onde todos pudessem viver condignamente, o que implicava alterações profundas na política, mas também na economia e nas condições sociais.

E, como “o sonho comanda a vida”, o Povo, com o apoio do MFA, orgamizou-se em partidos, sindicatos e outras estruturas e meteu mãos à obra, reclamando trabalho e melhores condições de vida, as nacionalizações e a Reforma Agrária como resposta à sabotagem económica dos que recusavam a mudança, não queriam perder privilégios nem contribuir para a melhoria das condições do país e da vida das pessoas.

Este processo, que ficou conhecido como PREC – Processo Revolucionário em Curso -, rapidamente começou a ser contestado pelos saudosistas da ditadura e pelos que apenas estiveram com o 25 de Abril por defenderem a mudança de regime político e dos seus principais agentes sem porem em causa o sistema e a estrutura existentes.

O confronto entre a ala revolucionária e a ala moderada do MFA, incluindo os que pretendiam que o 25 de Abril não fosse mais do que um golpe militar que mudasse apenas o governo e pouco mais, começou logo com a demissão do primeiro-ministro Palma Carlos, a que se seguiu a do Presidente da República António de Spínola, que fomentou a intentona do 28 de Setembro, ainda em 1974, e o 11 de Março, em 1975.

Deste confronto, que culminou no dia 25 de Novembro de 1975, saiu vencedora a ala moderada do MFA, liderada pelo Grupo dos Nove, que, em 7 de Agosto de 1975, tinha lançado o “Documento dos Nove”, opondo-se ao modelo socialista da União Soviética, assim como à social-democracia europeia, propondo uma terceira via, baseada na “formação de um amplo e sólido bloco social de apoio a um projeto nacional de transição para o socialismo”, mas “inseparável da democracia política”. Vasco Lourenço, Capitão de Abril e presidente da Associação 25 de Abril, defendeu, por isso, que foi a a direita a “principal derrotada” do 25 de Novembro e que ela pretendeu, com esta comemoração, desvalorizar a relevância do 25 de Abril.

“As duas datas não são comparáveis”, disse o Coronel Sousa e Castro, lembrando que o 25 de Abril comemora a revolução que derrubou uma ditadura de 48 anos”, pelo que “não pode haver o mesmo tratamento”. E o general Pezarat Correia afirmou que “a democracia conseguiu-se não por causa do 25 de Novembro, mas apesar do 25 Novembro”, que “o 25 de Novembro que se está ali a comemorar não é o 25 de Novembro” em que ele próprio participou, e que é “contrário a esta celebração, como a de todas as datas fracturantes”.

Ou seja, esta comemoração serôdia do 25 de Novembro foi inventada para dividir o que a do 25 de Abril uniu. E quem tinha dúvidas de que assim seria pode dissipá-las ouvindo os discursos revanchistas e revisionistas da direita, num esforço oportunista de chamar a si uma vitória que não lhe pertenceu. Porque no dia 25 de Novembro de 1975, a direita, com raras excepções, não fez mais do que se esconder atrás do Grupo dos Nove, em termos militares, e do PS, no campo civil, numa tentativa de apanhar a boleia do comboio que perdeu no 25 de Abril de 1975.

Até para a semana!

LG, 26/11/2024

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