Crónica de Opinião – Lopes Guerreiro – 26/09/2023

Marco Abundância 26/09/2023

A crónica de opinião de Lopes Guerreiro.

Burocracia e corrupção

A burocracia pode ter significados diversos. Se alguns se referem à necessária organização dos serviços ou ao conjunto dos funcionários públicos, outros traduzem o que há de mais pejorativo nesses mesmos serviços e funcionários públicos.

O Léxico refere burocracia como “Todo o género de sistema que pode ser definido pela ausência de eficiência, pela morosidade de resolução de situações ou pela inexistência de preocupação com as reais carências ou necessidades de cada pessoa; procedimentos abusivos que sujeitam o cidadão a mecanismos oficiais desnecessários que adiam ou atrasam a resolução das respetivas situações” e a Infopédia, mais sucinta, define a burocracia como a “influência abusiva da administração, impedindo o prosseguimento de uma ação com procedimentos oficiais desnecessários”.

É aqui, no uso abusivo das funções e tarefas que desempenham os funcionários públicos, dificultando o tratamento de processos com procedimentos  desnecessários, que a corrupção muitas vezes começa. E ela está de tal forma enraizada na função pública, e não só, que a sociedade tende a achá-la normal, considerando muitas pessoas que sem cunhas nada conseguem.

Este uso abusivo começa logo no atendimento de quem tem necessidade de recorrer a serviços públicos para tratar de qualquer assunto, por mais corrente que seja, em que  muitos funcionários começam logo por levantar dificuldades, verdadeiramente inexistentes, para depois, mostrando a sua boa vontade, as ultrapassarem, como que por magia, e assim mostrarem o poder que têm.

Se em muitos casos a situação fica por aqui, pela auto-satisfação do funcionário, que mostrou o seu poder, e o temor do utente do serviço público, que se sente aliviado por ter tido a sorte de ter encontrado um funcionário que, com boa vontade, o desenrascou, em muitos outros começa aqui o calvário do utente que o leva a meter cunhas ou a ter de passar alguma coisa por baixo da mesa.

É este o princípio da corrupção. Quem precisa ou, principalmente, quem pretende conseguir aquilo a que não tem direito compra quem pode ajudar a alcançar o que,

por meios legais, não conseguiria.

E é aqui, como atrás tentámos explicar, que muitos se põem a jeito para facilitar, de forma ilegítima, usando poderes que não têm, os que estão na disposição de pagar para alcançar os seus objectivos, quase sempre igualmente ilegítimos e ilegais.

Quanto mais burocratizadas são as sociedades, quanto mais controladores são os governos e respectivas administrações, mais corrupção existe. E, infelizmente, esta é uma tendência que se está a acentuar, um pouco por todo o lado.

Veja-se o que acontece na União Europeia ou no nosso País, em que, apesar de tanto de se falar na necessidade de aperfeiçoar a democracia e de serem lançadas tantas medidas de simplificação administrativa e de combate à corrupção, a teia burocrática não para de crescer e aqueles objectivos parecem cada vez mais distantes.

A produção de leis e regulamentos que ninguém consegue interpretar, sem a ajuda de advogados, solicitadores ou outros técnicos especializados, bem como a sua frequente alteração, transforma a sua interpretação numa via sacra, raramente com bom fim.

O combate efectivo à corrupção tem de passar necessariamente pelo combate efectivo à burocracia, através da eliminação de serviços e procedimentos desnecessários, da redução da complexidade de leis e regulamentos.

Há muito que fico com medo sempre que oiço falar em reformas administrativas, porque acho que, mais do que grandes reformas, o que as administrações públicas necessitam é de medidas racionais concretas, que façam com que elas não infernizem tanto a vida das pessoas.

Quem não conhece serviços que não servem para nada a não ser para dar emprego a algumas pessoas ou, pior ainda, para complicar a vida das pessoas? Quem não tem conhecimento de procedimentos desnecessários, que só servem para atrapalhar a vida das pessoas? Então porque não se acaba com eles? É necessária uma reforma administrativa ou vontade política para lhe pôr termo?

Até para a semana!

LG, 26/09/2023

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