Crónica de Opinião – Lopes Guerreiro – 26/08/2025
Marco Abundância 26/08/2025
A crónica de opinião de Lopes Guereiro.
A ilusão de todos podermos ter tudo enfraquece a consciência social
Cada vez mais, as pessoas se preocupam mais com o “ter” do que com o “ser”. E não acontece por acaso. É promovido pelos que mais têm, mais poder, mais dinheiro, mais fama. Criam a ilusão de que todos podem ter o que eles têm, para que, cada vez mais, mais valorizem o “ter”, ambicionem ter o que eles têm, acreditando que também podem ter.
E, assim, iludidos com a ambição de poder ter tudo o que ambicionam, perdem a consciência social, esquecem as origens e quem são, desvalorizam a igualdade, a justiça, a solidariedade, a tolerância, a aceitação e a preocupação com o outro.
Sabemos que vivemos numa sociedade competitiva e consumista, onde ter, ter, ter… se tornou no foco principal de muitos. A sociedade de consumo em que vivemos empurra-nos para valorizarmos cada vez mais os interesses materiais, criando a ilusão de que podemos ter mais e cada vez mais, e os meios de comunicação estimulam esse consumismo com publicidade cada vez mais agressiva.
Termos como foco principal o “ter” é perigoso, porque nos torna alienados do que nos envolve, do que está ao nosso lado e na construção da sociedade.
Isto não quer dizer que o bom é vivermos com pouca coisa e não querermos ter mais coisas. Todos desejamos viver sem preocupações financeiras, ter uma vida segura, confortável e tranquila.
A questão não é essa. O problema é a alienação pela ilusão que nos vendem de todos podermos ter tudo e da felicidade estar apenas no “ter”, quando o que na realidade acontece é que poucos têm cada vez mais e a esmagadora maioria tem pouco, não chegando tantos a ter o mínimo para ter uma vida digna ou sequer para sobreviver.
O problema é as pessoas não entenderem que quem manda no mundo são os que têm quase tudo e que, usando governos e os cada vez mais poderosos meios de comunicação, fomentam a ilusão de que todos podemos aceder e ter tudo.
Na realidade, ao que assistimos é a retocessos nas conquistas de direitos universais. Cada vez mais, os poderes são usados em proveito de quem os tem e de quem a eles serve. Tudo vale para que os poderosos tenham cada vez mais, deixando alguma coisa para os que os servem e explorando cada vez mais os que produzem a riqueza.
Os direitos e garantias conquistados estão ser postos em causa e mesmo retirados em muitas situações. Veja-se, a título de exemplo, o que está a acontecer no nosso País.
O direito à Saúde não está a ser garantido a todos os portugueses. Mais de um milhão de pessoas não tem médico de família, continua a haver urgências fechadas, e há medicamentos, exames e tratamentos médicos que não são assegurados.
O direito à habitação é cada vez mais uma miragem para cada vez mais portugueses. São cada vez mais as pessoas que, apresar de trabalharem, não conseguem ter casa. Jovens adiam a saída de casa dos pais e a constituição de família porque não conseguem arranjar casa onde viver. E até expulsam famílias de barracas sem lhes garantir um tecto, com o argumento de que é para sua segurança e bem estar…
Os direitos sociais são cada vez mais postos em causa. Como compreender e aceitar que, num país em que a baixa natalidade é um dos principais problemas, o governo queira reduzir o tempo e apertar as regras para a amamentação dos bebés? Como aceitar que o governo, incentivado pelos patrões, pretenda aumentar a precariedade e horários de trabalho, e travar a valorização dos salários ao mesmo tempo que baixa os impostos sobre os rendimentos do capital? Como compreender e aceitar que num país de emigrantes, tantos deles ilegais, os imigrantes sejam, cada vez mais, discriminados e tratados como números e todos fossem criminosos, quando sem eles muitos sectores do país parava ou funcionava com muito mais dificuldades?
Não será através de baixos salários, da maior concentração da riqueza, do acentuar das desigualdades, da exclusão social e da discriminação que será assegurado um futuro melhor para todos e um maior desenvolvimento humano.
Este é o caminho que tem vindo a ser seguido, com os resultados que estão à vista. Se é isto que as pessoas querem bem podem continuar a deixarem-se iludir de que todos podem ter o que o que os poderosos têm, esquecendo quem são e as suas origens.
Até para a semana! LG, 26/08/2025