Crónica de opinião – Lopes Guerreiro – 15/10/2024
Marco Abundância 15/10/2024
A crónica de opinião de Lopes Guerreiro.
A quantas vozes devem falar os partidos?
De forma sucinta diria que os partidos devem falar a tantas vozes quantas as dos seus militantes até ser democraticamente definida uma posição oficial do partido e a uma só voz depois daquela ser aprovada.
Ou seja, enquanto um partido, através dos seus órgãos e dos seus mecanismos de funcionamento próprios, não tiver definida uma posição sobre um qualquer tema, todos os militantes deverão ter total liberdade de expressar as suas opiniões sobre o mesmo. O único limite a essa liberdade de expressão deverá ser a consciência de cada um. Mas a partir do momento em que for definida, de acordo com as regras de funcionamento internas, uma posição oficial do partido sobre qualquer tema, ela deverá ser respeitada por todos, o que quer dizer que os que estavam em desacordo com a posição definida se devem, pelo menos, inibir de continuar a manifestarem-se contra ela, principalmente através dos órgãos de comunicação social.
A adesão a um partido é voluntária e só a ele devem aderir os que estão de acordo, em termos gerais, com seu pensamento dominante, os seus princípios programáticos e de funcionamento e dispostos a contribuir para, em conjunto com os outros militantes, definir a estratégia, a política e as políticas do partido para as diversas áreas da sociedade e da governação e a baterem-se por elas.
A militância num partido não deve levar à violação da consciência de quem a ele adere. Mas essa avaliação só pode ser feita por cada um, que, em resultado das conclusões a que chegar, deve tirar as suas consequências, que podem passar pela saída do partido, se sentir que é mais importante o que o separa da sua orientação geral e do seu funcionamento do que o que permite identificar-se com eles.
Se da avaliação que fizer, embora tendo posições diferentes sobre diferentes assuntos da posição oficial do partido, entender que, apesar de tudo, é mais importante o que faz continuar a identificar-se com ele e, em consequência, a nele se manter, deve evitar contribuir para enfraquecer as posições de que discorda e, principalmente, alimentar as posições que outros defendem contra as do seu partido, mesmo que com elas concorde.
É claro que quando a direcção de um partido, ou, prior ainda, um grupo dentro da direcção de um partido usa o poder de que dispõe, subvertendo as regras internas de funcionamento, para se impor e impor políticas, orientações e medidas que não respeitem os mais elementares princípios democráticos, os militantes devem usar de total liberdade para defender as suas posições, interna e publicamente, de acordo com a sua consciência e o que entendem melhor servir os interesses do país e do partido.
A adesão a um partido é sempre condicionadora da liberdade dos que tomam essa decisão. Mas esse condicionamento deve ser assumido e respeitado em consciência por cada um e não imposto pela direcção partidária. Da mesma maneira que cada militante só deve manter-se num partido enquanto partilhar do seu pensamento e das suas regras de funcionamento referenciadores.
Quem queira ter total liberdade de expressar as suas opiniões sem ter em conta a defesa de posições comuns, definidas colectiva e democraticamente, não deve aderir ou manter-se num qualquer partido, onde a defesa daquelas posições comuns deve sobrepor-se à manifestação de posições individuais que não tiveram vencimento.
A militância num qualquer partido deve obrigar a uma boa dose de humildade, que permita aos que, mesmo embora podendo ter razão, não se manifestem, pelo menos publicamente, contra as posições do partido, quando a sua razão não for reconhecida pela maioria dos militantes.
O equilíbrio entre a força de um partido se expressar a uma só voz e a liberdade dos seus militantes expressarem livremente as suas posições, mesmo quando contrárias das oficiais, nem sempre é fácil de conseguir. Quando o partido está no poder, os militantes tendem a não contestar publicamente as suas posições, mesmo que delas discordem, sentindo-se mais tentados a manifestar publicamente as suas discordâncias quando o partido está na oposição. É isso o que se pode observar na actualidade da vida política nacional.
Até para a semana!
LG, 15/10/2024