Crónica de Opinião – Lopes Guerreiro – 14/02/2023
Marco Abundância 14/02/2023
A crónica de opinião de Lopes Guerreiro.
Os direitos só são garantidos com luta
Houve um tempo – durante e após a revolução de Abril -, em que os direitos adquiridos foram dados como intocáveis e irreversíveis. Mais uma ilusão, a juntar a tantas outras, que ajudaram a acreditar que estava próximo um mundo novo, mais justo e menos desigual, em que os direitos eram para todos e não apenas para alguns.
Nem todos tivemos a consciência de que tais direitos só tinham sido adquiridos com a luta, desse tempo e de tempos anteriores, e que só seriam garantidos no futuro com mais e mais luta. Os direitos, tal como o poder, não são oferecidos, são conquistados. A História, quer a mais antiga quer a mais recente, tal como o presente estão cheios de exemplos que comprovam isso mesmo.
Vem isto a propósito da luta dos professores, tal como de outros profissionais e sectores da sociedade, pelos seus direitos, alguns dos quais dados como adquiridos e que lhes foram sonegados no tempo da tróica. Com a criação da “geringonça” e a necessidade do PS fazer cedências aos parceiros mais à esquerda para poder governar, alguns desses direitos, ou parte deles, foram recuperados. A perspectiva da sua recuperação total foi-se, entretanto, desvanecendo à medida que o PS foi reforçando a sua posição eleitoral.
Com a maioria absoluta, e apesar de António Costa ter afirmado que maioria absoluta não significava poder absoluto, o seu governo não tardou em mostrar ao que vinha – ter contas certas, para mostrar à Comissão Europeia como Portugal era tão bom aluno como no tempo de Cavaco Silva. E António Costa está a levar esse desígnio tão longe que é até a Comissão Europeia e outras entidades internacionais, que lhe chamam a atenção para que não deve ir tão longe…
As relações de poder são sempre desequilibradas. Isso é bem evidente nas relações políticas, económicas e sociais. Quem está no poder, quanto mais poder tem mais dificuldades tem em respeitar as oposições, designadamente as que têm menos peso. Os grandes grupos económicos desrespeitam, com demasiada frequência, quer os produtores quer, principalmente, os consumidores. Os bancos servem-se do dinheiro dos depositantes, cujos depósitos remuneram mal, para cobrar juros elevados e diversas taxas aos seus clientes. Os senhorios nem sempre respeitam os direitos dos inquilinos. Os patrões usam, com excessiva frequência, os trabalhadores como mero factor de produção, ignorando a sua condição de seres humanos com direitos.
Com a promessa de combater esses e outros abusos, o Estado cria as mais diversas entidades reguladoras, cuja acção, na prática, tem sido completamente subvertida, limitando-se não raras vezes a legitimar esses mesmos abusos. Veja-se o que aconteceu com os bancos, com as privatizações, designadamente do sector energético, com as telecomunicações, com as auto-estradas e tantos e tantos outros sectores em que os reguladores pouco mais têm feito do que dar cobertura a todos os abusos praticados pelos que devia regular.
Todos queremos ter contas certas. Mas nem todos conseguimos tê-las. Há muitas pessoas que, mesmo trabalhando, não conseguem que o rendimento disponível chegue até ao fim do mês. E, pelo contrário, há algumas outras que, com apoios e facilidades do Estado às suas empresas e actividades, vêem a sua riqueza a crescer, concentrando-se cada vez mais.
Tudo isto mostra bem como os direitos, principalmente de quem trabalha, só serão recuperados, garantidos ou reforçados com luta de quem deles precisa. Só com essa consciência e unidade na acção a situação poderá ser alterada e os direitos efectivamente garantidos.
Pensem nisso. Até para a semana!
LG, 14/02/2023