Crónica de Opinião – Lopes Guerreiro – 12/09/2023
Marco Abundância 12/09/2023
A crónica de opinião de Lopes Guerreiro.
A educação é mesmo uma paixão?
Em 1995, por altura da campanha eleitoral, António Guterres lançou o slogan da paixão pela educação. Em 2015, novamente numa campanha eleitoral, António Costa afirmou: “É hora de voltarmos a dizer, … , que a educação tem que ser de novo uma paixão deste país e é necessário investir na nossa Educação”.
A poucos dias do início de mais um ano lectivo, importa reflectir até que ponto a paixão do PS pela Educação se tem efectivado, até porque está mais próximo de falhar um país que não aposta tudo na educação e formação da sua população, porque a escola pública deve ter como principal função servir de elevador social, corrigindo desigualdades sociais e contribuindo para criar uma sociedade mais justa.
António Costa, na Academia da JS, recordou essa paixão do PS pela Educação enaltecendo o aumento significativo registado de alunos no ensino pré-primário e superior e na redução, também significativa, dos números do abandono escolar, entre outros indicadores positivos, entretanto registados, garantindo que o governo iria continuar essa aposta.
Entretanto, para além das polémicas reformas na carreira docente e na avaliação do desempenho dos docentes no ensino básico e secundário, assistiu-se a uma degradação ininterrupta da imagem da profissão docente e do declínio do seu reconhecimento social, daí tendo resultado o crescente desinteresse pela carreira docente, que está a dificultar ou, mesmo, impedir o preenchimento de todas as vagas, devido à aposentação de um elevado número de professores e aos baixos números de estudantes a formarem-se para a docência.
Todos temos ainda presente o que foi o ano lectivo passado, que se desejava que fosse um ano de regresso à normalidade, depois dos problemas causados pela pandemia da COVID-19, e que acabou por ser um ano muito complicado para os alunos e famílias, em resultado das inúmeras greves registadas ao longo do ano. Este ano, e ao contrário do que afirma o governo do optimista António Costa, tudo indica que vamos continuar com mais do mesmo, tendo os sindicatos agendado mais greves, pelos objectivos por que lutaram durante todo o ano passado sem terem, em sua opinião, alcançado mais do que algumas migalhas e alguns presentes envenenados. E, entretanto, segundo os sindicatos, as aulas vão recomeçar com centenas de tempos por preencher por falta de professores e alguns destes a não aceitarem a colocação longe de casa, por não conseguirem suportar os custos da deslocação e do alojamento, com as dificuldades para alunos e famílias que daí resultam .
Mas – e voltando um pouco atrás -, apesar dos indicadores positivos registados nas últimas décadas, na educação, Portugal continua a ser um dos países com as maiores desigualdades da Europa, sendo o quinto país da União Europeia mais desigual e o oitavo com maior taxa de risco de pobreza ou exclusão social. Se tivermos em conta os dados da OCDE, que apontam para que sejam necessárias cinco gerações para que as crianças de famílias mais pobres consigam atingir o patamar das da classe média, é fácil concluirmos o quanto não foi feito e ainda há por fazer.
Por outro lado, os baixos salários pagos aos técnicos superiores, principalmente no início das carreiras, está a levar muitos jovens licenciados a emigrar, desperdiçando todo o investimento feito neles pelo Estado e criando dificuldades de recrutamento nalgumas áreas, com o Serviço Nacional de Saúde à cabeça.
A paixão pela educação tem de ser menos platónica e ter mais em conta as dificuldades com que ela se debate. O governo tem, quanto antes, de tomar medidas que revalorizem as carreiras docentes, de forma a travar os pedidos de aposentação mais precoces e a acelerar a formação de novos professores e a compensar os professores deslocados. Tal como tem de ajudar mais nas despesas de alojamento, alimentação e deslocação dos alunos que, para estudar, têm de sair de casa das famílias. E, talvez o mais importante e decisivo, o governo tem de promover uma rápida e justa revalorização do trabalho e dos trabalhadores, para que estes deixem de empobrecer trabalhando, os jovens licenciados deixem de emigrar à procura de melhores condições e a educação possa exercer efectivamente o seu papel de elevador social.
Até para a semana! E um bom ano lectivo a todos os que nele estejam envolvidos!
LG, 12/09/2023