Crónica de Opinião – Lopes Guerreiro – 09/04/2024
Marco Abundância 09/04/2024
A crónica de opinião de Lopes Guerreiro.
A que se deve a confiança que Luís Montenegro aparenta?
Como se sabe a AD ganhou as eleições por uma unha negra, com apenas mais dois deputados do que o PS, e apesar de ter obtido uma votação quase dois pontos percentuais abaixo da obtida em 2022, depois de Marcelo Rebelo de Sousa tudo ter feito para que o PSD regressasse ao governo.
Entretanto, na tomada de posse do governo assistimos a dois discursos – do Presidente da República e do primeiro-ministro empossado -, bastante distantes quando à avaliação do quadro político resultante das eleições de 10 de Março.
Marcelo Rebelo de Sousa lembrou a mais pequena maioria relativa de sempre que suporta o novo governo e, com base nela, alertou para a necessidade do primeiro-ministro procurar alargar a outros partidos o apoio para a sua governação, principalmente para conseguir a viabilização do Orçamento de Estado, e de, entretanto, ir tentando ganhar mais confiança dos portugueses através da resolução dos problemas concretos.
Luís Montenegro falou, mostrando grande confiança, como se tivesse o apoio de uma maioria absoluta, assegurando que tomou posse para governar quatro anos e meio, reafirmando as propostas do programa eleitoral da AD, nunca manifestando qualquer vontade para concertação de posições com o PS e, simultaneamente, reclamando responsabilidade das oposições e repetindo Cavaco Silva: “deixem-nos trabalhar”.
Esta confiança toda que Luís Montenegro tem manifestado em todas as ocasiões só pode ser resultado da garantia do Chega de lhe assegurar apoio, sempre que necessário, designadamente na votação do Orçamento de Estado, ou de uma enorme irresponsabilidade. Há ainda uma terceira hipótese, que não passa de uma variante desta última, que será a possibilidade de governar por duodécimos, no caso de não conseguir a aprovação do Orçamento de Estado, tentanto responsabilizar o PS pela instabilidade política e impossibilidade de aprovar algumas medidas.
Se a primeira hipótese se vier a verificar, confirmar-se-á que afinal “o não não é não” e que havia um acordo entre Luís Montenegro e André Ventura e os respectivos
partidos, como muitos (antigos e actuais) dirigentes do PSD têm defendido.
A possibilidade de governar por duodécimos, para além de precisar da mudança de posição do Presidente da República, que, nestas situações, tem optado por ouvir os eleitores marcando eleições, seria muito difícil de garantir no actual quadro face aos compromissos assumidos, designadamente com os programas plurianuais com financiamentos comunitários mas que exigem comparticipações nacionais.
Assim e tendo em conta que Pedro Nuno Santos avisou, logo na noite das eleições, que o PS seria oposição e que não suportaria um governo do PSD com um programa com base no programa eleitoral da AD, de cujas principais propostas discorda, pelo que não aprovaria o Orçamento de Estado para 2025, e acreditando que Luís Montenegro não é irresponsável, a confiança que revela só pode ser fruto do apoio do Chega, o que volta a colocar-se na ordem do dia.
Apesar do silêncio mantido por Luís Montenegro relativamente ao Chega, as várias e cada vez mais frequentes declarações de responsáveis do PSD de normalização das relações e da cooperação com aquele partido, parecem indiciar isso mesmo.
Embora o PS tenha manifestado, por várias vezes, disponibilidade para acordar as condições de aprovação imediata de algumas medidas, designadamente a valorização das carreiras da função pública, bem como a de um eventual orçamento rectificativo, Luís Montenegro só reagiu depois de receber uma proposta escrita, parecendo, com o seu silêncio, não contar com o PS para se manter no governo.
A posição do Chega na votação, esta semana, do Programa do Governo na Assembleia da República, que conta à partida com a abstenção do PS anunciada pelo seu líder logo na noite das eleições, talvez ajude a clarificar o que se vai passar nos tempos mais próximos, pelas leituras políticas que vai permitir fazer. Vamos ver até onde vai a sua oposição e se vai recusar a apoiar o PSD nas medidas mais decisivas do governo e na Assembleia da República, acusando-o de ter escolhido o PS para parceiro para manter o bloco central de interesses, como tem feito até agora.
Até para a semana! LG, 08/04/2024