Crónica de Opinião – Lopes Guerreiro – 06/02/2024
Marco Abundância 06/02/2024
A crónica de opinião de Lopes Guerreiro.
Forças de segurança já pisaram o risco?
Há muito que todas as forças de segurança reclamam melhores condições de trabalho, remuneratórias e de segurança. O suplemento de missão atribuído em Novembro à Polícia Judiciária, com retroactivos a Janeiro de 2023, foi considerada, pelos sindicatos das outras polícias, “uma anormalidade” que ia “inflamar ainda mais” o desagrado dos agentes das outras forças de segurança.
Desde então, as acções de protesto dos agentes das forças de segurança não pararam mais, assumindo as mais diversas formas, desde vigílias a concentrações e manifestações, passando pela recusa de usar viaturas em mau estado, apresentação generalizada de justificações de doença para não comparecer ao serviço, e culminando na ameaça de boicote às eleições para a Assembleia da República e na ausência de jogos de futebol – um da Primeira Liga e dois da Segunda Liga -, que, por essa razão, não se realizaram, com todas as consequências daí resultantes.
A luta que as polícias vinham travando, exercendo os seus legítimos direitos, que o estado de direito democrático lhes consagra, estava a ser respeitada pelo governo e a reunir uma simpatia e apoio generalizados da sociedade portuguesa.
O comportamento da GNR e da PSP no acompanhamento das acções de protesto, com tractores e outras máquinas e alfaias agrícolas, realizadas pelos agricultores, convocadas por um auto-denominado Movimento Civil de Agricultores de Portugal, em várias zonas do País – marchas lentas e cortes de estradas e fronteiras e ocupação de espaços públicos de algumas cidades -, na Quinta-Feira, foram realçados e reconhecidos em termos gerais.
Este capital de simpatia e reconhecimento por garantirem a nossa segurança, poderá ter sido perdido – em que medida só o tempo dirá -, com a ameaça de boicote às eleições legislativas do dia 10 de Março e, de forma mais perceptível ainda, com a falta de presença dos polícias, que justificaram a sua ausência por doença, em jogos de futebol agendados para o fim-de-semana, que por essa razão não se realizaram, tendo-se registado, à entrada do estádio onde se devia ter realizado o jogo da Primeira Liga, confrontos entre adeptos, com registo de alguns feridos, um dos quais em estado grave.
A gravidade destes acontecimentos levou o ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro a reunir com o comandante-geral da GNR e o director nacional da PSP, a quem deu instruções para tudo fazerem para que a prática de actos de indisciplina e insubordinação não voltem a verificar-se, não permitindo actos que possam colocar em causa a segurança dos cidadãos, frisando que o direito de manifestação é legítimo “mas tem limites e o limite é o da garantia do cumprimento da missão que está confiada às forças de segurança” num estado de direito democrático, pelo que todos o actos que atentem contra o cumprimento desses deveres serão objecto de “participação disciplinar e eventualmente participação criminal”.
Garantiu ainda que indícios de actos relativos a atitudes, comportamentos e práticas extremistas que possam estabelecer uma relação entre o incitamento à insubordinação e a eventual ligação a movimentos extremistas serão participados imediatamente à Inspeção Geral da Administração Interna e ao Ministério Público.
José Luís Carneiro realçou ainda que, embora reconhecendo a necessidade de rever as condições dos agentes da autoridade, designadamente as remuneratórias, o governo não pode agora tomar decisões que representem encargos fixos duradouros, por estar em gestão.
Ou seja, perante aqueles graves acontecimentos atentatórios da segurança das pessoas, o ministro da Administração Interna fez o que lhe competia: agiu rápido e com firmeza, lembrou os limites que existem ao exercício do legítimo direito à manifestação e exigiu às hierarquias que repusessem a ordem nas forças da ordem, assegurando que actos de indisciplina, insubordinação e instrumentalização dos agentes não seriam permitidos, de forma a assegurarem a segurança das populações.
Se a generalidade dos agentes aderiu à luta por considerarem se desvalorizados e desrespeitados e acharem justas as suas reivindicações, também tudo indica que há quem os pretenda instrumentalizar para outras “guerras” que não são as suas.
E, com estes acontecimentos e desta forma, permitindo que fosse percepcionado que que estão mais preocupados com os seus legítimos interesses do que com o cumprimento da sua missão de assegurar a segurança às populações, como lhes compete, os polícias poderão ter pisado o risco e desperdiçado uma boa parte do apoio generalizado que estavam a angariar para a sua luta pelas suas justas reivindicações.
A forma como agirem daqui em diante, designadamente até à realização das eleições e a tomada de posse de um novo governo será decisiva para as forças de segurança em luta recuperarem e reforçarem o capital de simpatia e apoio que vinham angariando, ou desbaratarem-no, através de acções que possam por em causa a segurança das pessoas e do estado de direito democrático.
Até para a semana!
LG, 06/02/2024