Crónica de Opinião – Lopes Guerreiro – 20/02/2024

Marco Abundância 20/02/2024

A crónica de opinião de Lopes Guerreiro.

 

O regime está a caminho do abismo

No ano em que comemoramos o 25 de Abril, que abriu portas à restauração da democracia, esta mostra como, apesar de ser uma das principais construções da humanidade, se mantém inacabada e exige contínuas melhorias.

A democracia, sendo uma emanação da vontade popular, manifestada através de eleições livres, não pode ser reduzida apenas a esse acto, apesar dele ser muito importante. Exige, cada vez mais, um maior escrutínio dos seus órgãos, a começar nos eleitos directamente, mas também aos criados e mantidos por aqueles.

A legitimidade democrática não pode limitar-se a ser sufragada apenas nas urnas no final dos mandatos. Exige escrutínio permanente e avaliações frequentes do cumprimento de políticas, medidas e promessas apresentadas nas eleições pelos que ganharam a confiança dos eleitores para as porem em prática.

Ora, ao que assistimos com demasiada frequência é ao incumprimento, no todo ou em grande parte, daquelas políticas, medidas e promessas eleitorais. Daí o crescente descrédito em que têm vindo a cair os partidos políticos, os políticos em geral e os representantes dos órgãos de soberania em particular, e, em consequência, as elevadas taxas de abstenção que se têm vindo a registar nas eleições.

As elevadas expectativas, geradas no eleitorado com promessas eleitorais sem limites, frequentemente defraudadas pela realidade subsequente, levam elevadas percentagens de eleitores a demitirem-se do seu direito / dever de votar, por considerarem que o seu voto de pouco vale, ou a votar em quem se apresenta contra o sistema, que pretende manter e agravar no que de pior tem, e apenas quer acabar com o regime democrático, por estar já tão revoltado que quer que as coisas mudem de qualquer maneira, nem que seja para pior.

A Justiça é um dos principais pilares do estado de direito democrático, devendo este  garantir a separação de poderes e a sua autonomia, de acordo com a legislação aprovada pelo poder político e com os meios necessários, que lhe devem ser assegurados pelo orçamento do estado.

E daí ter-se tornado frequente ouvirmos a afirmação de que à Justiça o que é da Justiça e à Política o que é da Política. Ora, esta afirmação não é inteiramente verdadeira, porque temos a Justiça que a política quer e aprova. A Justiça realiza-se julgando o cumprimento das leis que os órgãos políticos com poder legislativo – Parlamento e Governo -, aprovam e o Presidente da República promulga, e com os meios que lhe são disponibilizados pelo poder político.

Os que fazem aquela afirmação o que pretendem dizer é que, no respeito pela separação de poderes, a Justiça não deve influenciar a Política nem esta deve condicionar aquela. E esta é a questão que devia estar a ser debatida e de que (quase) todos parecem fugir.

Em consequência, não só mas também, da acção da Justiça, em menos de três meses, o primeiro-ministro do governo da Nação e o presidente do governo da Região Autónoma da Madeira pediram as suas demissões, encontrando-se os dois governos em gestão, tendo sido dissolvida a Assembleia da República e aguardando o mesmo fim a Assembleia Regional da Madeira.

Na sequência de aparatosas intervenções judiciais e policiais foram detidos suspeitos da prática de diversos crimes lesivos do nosso património comum. Depois de demasiados dias de detenção e quando se esperava que, face às provas reunidas, todos os suspeitos, ficassem em prisão domiciliária, face à gravidade dos crimes de foram indiciados pelo Ministério Público, eis que os Juízes concluíram não haver, ou de não serem suficientemente fortes, os indícios da prática de crimes, pelo que os mandaram em liberdade.

Perante esta situação que deixou o País perplexo, logo alguns responsáveis políticos se apressaram a garantir que ela demonstrava que a Justiça estava a funcionar. E nós, cidadãos comuns, podemos acrescentar que está a funcionar mal. Podemos não ter os conhecimentos necessários para apontar o que está a funcionar mal, mas todos percebemos que ou o Ministério Público fez mal o seu trabalho, não reunindo as provas suficientes para justificar a detenção dos suspeitos da prática dos crimes, ou os Juízes foram levianos na avaliação da gravidade dos indícios apresentados da prática de crimes de que são suspeitos.

O mínimo que podemos dizer é que uma das duas partes errou – ou o Ministério Público ou os Juízes. Com a agravante de estarem em causa crimes graves, com grande impacto na Política, e dos erros se poderem ter repetido, com as mesmas consequências.

Como se isto não bastasse, também quem tem como obrigação garantir a nossa segurança não assegurou a sua missão, metendo “baixas colectivas simultâneas” e ameaçou voltar a fazê-lo no dia das eleições. Por mais legítimas que sejam as suas reivindicações – e são -, as forças de segurança ultrapassaram claramente os limites.

E assim, intencionalmente ou por inconsciência, se vai alimentando a percepção de que tudo o que está mal se deve ao regime democrático e que, por isso, é preciso mudar de regime e acabar com a bandalheira, com um governo autoritário, chefiado um um homem providencial. E, todo o branqueamento que se tem permitido fazer do período ditatorial que o País suportou no meio século anterior ao 25 de Abril muito tem contribuído para a desvalorização dos perigos que correríamos se a ele regredíssemos.

Seria importante que, por tudo isso, a campanha eleitoral, ao contrário da pré-campanha, se centrasse nos grandes problemas que afectam o País, nos maiores riscos que corre e nos principais desafios que temos de enfrentar.

Pensem nisso! Até para a semana!

LG, 20/02/2024

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