Crónica de Opinião – Lopes Guerreiro – 01/11/2022

Marco Abundância 01/11/2022

A crónica de opinião de José Lopes Guerreiro.

Muito se tem falado nos casos de abusos sexuais praticados por representantes

da Igreja Católica, alguns dos quais contando com a cobertura ou inacção da

respectiva hierarquia. Nada disto é novo. Quem não tem conhecimento de

situações contrárias às regras da Igreja Católica, praticadas por signatários dela,

nas mais diversas situações. Quem não conheceu um pároco de aldeia que vivia

com uma “sobrinha” ou uma “governanta”, quem não conhece padres com vários

filhos, por vezes de diferentes mulheres, só para citar casos que sempre foram,

mais ou menos, aceites pelas comunidades e ignorados pela hierarquia

eclesiástica.

O que os casos agora revelados, um pouco por todo o lado, têm provocado maior

choque e pior reacção por partes das pessoas é o facto de se tratarem de abusos

de menores, a maioria dos quais à guarda ou no âmbito de actividades da Igreja

Católica, que tinha a obrigação de os proteger.

Nada disto é novo e vem muito de trás, diria mesmo que desde que a Igreja

Católica é Igreja, é uma instituição, com o Clero a assumir-se como uma casta a

quem os crentes devem obediência. Basta conhecer-se um pouco da história da

Igreja Católica, para se saber de todo o tipo de desmandos, em muitos casos

incluindo aquilo a que hoje classificamos de crimes contra a humanidade. Basta

ter presente o que foram as guerras da expansão do catolicismo… No campo

estrito dos abusos sexuais há imensa literatura sobre o assunto ao longo da

história.

O que faz a diferença entre o tratamento que é dado a estes casos e o que era a

prática seguida ainda há bem pouco tempo é o maior escrutínio público das

instituições que é feito, através da comunicação sociais e das redes sociais, que

obriga as autoridades da Justiça e da Igreja Católica a terem de investigar e julgar

os casos denunciados, se for caso disso.

Ainda não há muito tempo, alguns destes casos eram resolvidos pela hierarquia

da Igreja Católica com a transferência dos infractores / criminosos de funções ou

local em que as exerciam. Também era recorrente, para se puderem manter em

funções na Igreja, a imposição da negação da prática de tais actos.

 

Basta assistirmos às explicações e justificações atabalhoadas dos mais altos

dignatários da Igtreja Católica, para percebermos como não se sentem à vontade

ao darem-nas, porque alguns têm rabos de palha… O exemplo do Bispo do Porto

é bem ilustrativo de como há, na hierarquia da Igreja Católica, quem ainda não

assumiu a gravidade da situação e tudo faz para a desacreditar.

É evidente que todos os casos que venham a ser identificados deverão ter o

tratamento devido na Justiça e na Igreja Católica. Não deixa, apesar de tudo, de

surpreender que alguns eclesiásticos procurem justificar os abusos sexuais

argumentando que é uma situação transversal a toda a sociedade, como se a

Igreja Católica não tivesse mais responsabilidades que outras instituições… que

justifiquem que não tomaram medidas quando tomaram conhecimento dos casos

porque as regras eram outras ou que os casos devem ser tratados pela Justiça,

como se a Igreja Católica, pelos princípios que diz defender, não devesse intervir

logo, desde sempre e independentemente de ter sido ultrapassado o prazo para a

Justiça poder intervir…

É evidente que todos os casos que venham a ser identificados devem ter o

tratamento devido, quer a nível da Justiça, quer, sem reservas nem desculpas,

pela hierarquia eclesiástica. Mas, parece-me também evidente que muitos destes

casos se devem à normalização que a Igreja Católica tentou fazer de uma uma

situação contranatura, ou seja, a proibição de vida sexual, de “casamento” e de

outras situações aos seus membros. O que, ao longo, dos séculos se foi

mantendo com uns a “fecharem os olhos” e outros a terem de suportar os abusos

sem apelo mem agravo, face ao grande peso do Clero na sociedade. Os tempos

mudaram muito e muito rapidamente e a Igreja Católica, como todas as

instituições e, principalmente com o peso de todo o seu passado, não foi capaz,

porque tem tido grandes resistências no seu interior, apesar dos esforços,

designadamente do Papa Francisco, a adaptar-se aos novos tempos. Em que

medida é que ainda vai a tempo de se regenerar é a questão que se coloca. Para

já, assistimos a ondas de choque de consequências ainda imprevisíveis.

A Voz dos Outros

Espaço dedicado ao Concelho de Vidigueira e à Região.

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